Artigos SPROWT | Jónia Chilusse Presado

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Liderança feminina, uma guerra de sexos?

Liderança feminina no mundo corporativo

Até ao século 19, não havia movimentos significativos pela equidade do género, existia sim uma relação entre género e função social com deveres e limitações ensinados desde o nascimento de cada criança. Aos homens cabia o papel de provedor da sua família e às mulheres cabia tarefas consideradas inferiores como trabalhos domésticos que normalmente não são remunerados. Quando as mulheres entraram para o mercado de trabalho formal no século 20, a sua participação manteve-se restrita a cargos auxiliares por décadas. Pecaríamos se falássemos em liderança feminina sem contextualizar o assunto e sem recorrer ao pensamento ou as bases que dominavam a sociedade mundial até a poucas décadas atrás. A elevada desigualdade do género é uma reflexão desse pensamento que ainda persiste em algumas partes do mundo.

Vivemos num século em que se exalta a igualdade e equidade de género em todas esferas, com especial foco no mundo corporativo. Mas, como se espera respeitar os direitos da mulher, quando simples direitos humanos ainda estão a quem de ser respeitados? E porque a liderança é parte integrante dos direitos exigidos pela mulher na busca da igualdade do género, tem se salientado cada vez mais a sua existência e o tema vem merecendo uma atenção especial no mundo inteiro.

Afinal o que é, e como surge a liderança feminina!

A participação feminina no mercado formal foi impulsionada pela revolução industrial entre os séculos 18 e 19 e mais tarde com o movimento sufragista que surgiu após a Primeira Guerra Mundial. A inserção das mulheres ganhou mais força com o direito ao voto para o público feminino, assim como outros direitos que se foram adicionando com o fim da Primeira Guerra Mundial, porque milhares de homens perderam a vida, outros ficaram mutilados e outros tiveram outras sequelas que os impossibilitava de trabalhar, o que levou as mulheres destes assim como as várias viúvas a deixar os seus lares e ir trabalhar fora para prover o sustento do seu lar. E assim começou a liderança feminina.

É indiscutível que ambos sexos têm as suas diferenças e jeitos próprios de liderarem, mas isso não é nem deve ser visto como um problema para as organizações, uma vez que o género não define competências, tanto o homem como a mulher podem ser bons ou maus líderes, o seu sucesso depende do mérito de cada um no desenvolvimento das suas funções dentro da organização. Daí que a liderança feminina e a liderança masculina não devem ser vistas como uma guerra de sexos, mas sim como lideranças complementares.  

Liderança Feminina é um termo criado para descrever uma condição de influência em relação a um grupo, departamento ou empresa, a fim de guiá-lo na busca pelos objectivos da organização. Esta expressão tem um sentido mais profundo que inclui décadas de mobilização feminina com o intuito de garantir a sua participação nas esferas sociais a que, tradicionalmente, as mulheres não tinham acesso, tal como a política e o mercado de trabalho. Hoje têm acesso a ambos, mas por vezes ainda um tanto limitado no que concerne a posições estratégicas no mundo corporativo.

A liderança feminina tem como características: a inteligência emocional, autoconfiança, capacidade de influencia, resiliência, assertividade, bom humor, tendência a cooperação, maior flexibilidade, empatia, maior desenvolvimento no relacionamento interpessoal e clima organizacional leve.

É de louvar o trabalho que a mulher tem feito para ganhar o seu lugar no mundo corporativo apesar dos desafios que tem enfrentado como o preconceito, a discriminação, resistência ao almejar cargos estratégicos, a demandas da vida familiar, a autossabotagem e o medo de falhar entre outros. Ainda assim, hoje já se veem mulheres ocupando cargos de liderança em vários sectores, inclusive em sectores outrora considerados exclusivamente masculinos como o da engenharia por exemplo. No entanto, as mulheres ainda são uma minoria em cargos de administração, na maioria das vezes recebendo salários mais baixos que os homens devido a postura discriminatória e ofensiva e a desigualdade de género que precisam por sua vez de ser banidos, no contexto geral da sociedade pois, a liderança feminina é essencial para melhorar a distribuição de renda, combater o preconceito e atingir a justiça social.

Sugundo o estudo Diversity Matters da consultoria McKinsey ficou comprovado que as empresas que possuem equipes executivas com equidade de género tem 14% mais chances de superar a performance dos concorrentes. As empresas cujos funcionários percebem maior equalização entre as oportunidades para mulheres e homens, possuem 93% maior probabilidade de obter um desempenho financeiro superior ao da concorrência, isto porque há uma maior diversidade nas ideias o que favorece a criatividade e o desenvolvimento de soluções inovadoras, que promovem visões distintas sobre um determinado tema o que leva a caminhos mais sustentáveis a longo prazo, e tudo isto só é possível com a complementaridade.

As condições de trabalho, o salário e o respeito nas empresas não podem ser ignoradas quando o tema é Liderança Feminina no mundo corporativo. Por outro lado, a própria mulher deve ter auto estima e respeito por si própria, procurando se formar e trabalhar com afinco para atingir cargos superiores por mérito próprio.

Diz-se que “educar uma mulher é empoderar uma sociedade” por isso, para mudar este cenário, devemos acabar com as barreiras culturais, económicas, jurídicas entre outras e apostar mais num ensino académico de qualidade, numa educação sustentável, em programas de liderança nas escolas e no trabalho, criar espaços de apoio para aperfeiçoar as competências e coaching por role models para estimular a autoconfiança das mulheres jovens, etc.

Em Moçambique por exemplo, ainda se encontram algumas instituições com 0% de liderança feminina, sem uma única mulher em cargos de gestão ou posição estratégica, razão pela qual a maioria das organizações se veem hoje obrigadas a contractar determinado numero de mulheres para cargos de liderança ou gestão por forma a respeitarem a inclusão da mulher como forma de atingir a equidade do género no mundo corporativo. Reconheço e congratulo as empresas que já ultrapassaram essa barreira e trabalham numa gestão de igualdade.

Toda mulher e de certa forma uma líder, começa por liderar o seu eu, a sua vida, os seus filhos, os seus funcionários domésticos, e se tiver oportunidade acaba liderando uma equipe numa determinada organização. Sinto-me privilegiada por liderar também fora do ambiente doméstico num mundo ainda tão desigual para a liderança feminina e faco esforço para conseguir preparar e transformar mais mulheres em lideres.

Lanço um apelo ao mundo corporativo no sentido de não incluir a mulher na liderança apenas como obrigação para atingir um número exigido nas diretrizes da empresa, mas sim para que o faça naturalmente como algo correcto a fazer, e que passem a ver este acto como um direito humano que assiste a mulher tal e qual assiste ao homem. Quanto a nós mulheres lideres em Moçambique, pratiquemos a sororidade e o empoderamento da mulher, para que mais mulheres se transformem em líderes bem preparadas para ocupar lugares estratégicos não a frente nem atrás, mas ao lado dos homens, em todos sectores empresariais, políticos e industriais. Deste modo garante-se uma maior oportunidade de equidade na liderança no geral para as próximas gerações.