Considerações sobre a Ciência e a Sustentabilidade
Artigos SPROWT | Mario Forjaz Secca
Considerações sobre a Ciência e a Sustentabilidade
Actualmente as palavras são tão usadas e mal usadas que o seu real significado fica perdido e obscurecido, tornando-se elas muitas vezes chavões brandidos por questões ideológicas sem haver a preocupação de regressar ao seu verdadeiro significado etimológico, à fonte da sabedoria. Assim as palavras tornam-se ocas, irrelevantes. Se não acordarmos no significado que estamos a dar às palavras que usamos nas nossas conversas, nos nossos diálogos, eles tornam-se estéreis e não podem levar a nada, apenas a um degladiar de palavras. Nem de ideias poderá ser, porque para isso é preciso haver concordância de conceitos.
Duas dessas palavras usadas e abusadas são “Ciência” e “Sustentabilidade”. Pode parecer estranho que a palavra Ciência seja mal usada, mas quando ouvimos afirmações bombásticas do tipo “está cientificamente provado que…”, ou “eu acredito na Ciência”, ficamos logo com a certeza que muita gente não entende o que é a Ciência.
A Ciência não é definitiva ou peremptória, por isso, dizer “está cientificamente provado que…” é fechar a porta a um avanço contínuo da Ciência, a uma possível explicação alternativa num futuro de avanço científico. Há observações e constatações que parecem válidas e funcionam no enquadramento científico actual, o actual paradigma. Contudo, apesar de muita da tecnologia funcionar baseada nisso, futuros refinamentos científicos, futuras explicações alternativas, podem-nos trazer uma abordagem diferente, uma interpretação diferente.
A Ciência é também um questionar constante, não é um dogma ou uma crença, por isso dizer “eu acredito na Ciência” é uma frase vazia de sentido. Na Ciência não se acredita, segue-se e aplica-se o seu método.
A Encyclopedia Brittanica define Ciência como “qualquer sistema de conhecimento que se ocupa do mundo físico e dos seus fenómenos e que implica observações imparciais e experimentação sistemática.” E o Dicionário de Oxford define Ciência como “conhecimento acerca da estrutura e comportamento do mundo natural e físico, baseada em factos que se podem provar, por exemplo por experimentação”
Podemos ver que há aqui um pendor físico, material e experimental, no âmbito da Ciência.
Mesmo na Wikipedia que define Ciência como “um empreendimento sistemático que constrói e organiza o conhecimento sob a forma de explicações e previsões testáveis sobre o universo.”, há a ideia final de Universo, que normalmente é visto como uma entidade física, material.
Vemos assim que o lado mais humano e filosófico do nosso mundo interior fica de fora da abordagem científica.
Actualmente, ao termo Ciência associamos invariavelmente o conceito de Tecnologia. Não só dizemos “Ciência e Tecnologia” como muitas vezes confundimos Ciência com Tecnologia.
Na realidade a Ciência não explica, não nos dá respostas filosóficas, não acarreta significados. A Ciência encontra relações entre as coisas, aponta para problemas maiores e permite-nos produzir Tecnologia. Mas não confundamos Conhecimento com Tecnologia!
Contudo devemos ter sempre presente que a Ciência nos abre portas para pensar e questionar o mundo filosoficamente.
Ainda sabemos tão pouco!!! A prova disso é que se olharmos à nossa volta há tantos problemas por resolver para os quais não temos soluções nenhumas.
Com a Ciência aprendemos as relações do mundo natural que nos rodeia e aplicamos esses conhecimentos a ideias inovadoras que nos permitem produzir novas tecnologias. E uma das ideias é o Desenvolvimento. Contudo o Desenvolvimento é também um conceito que precisa de definição.
O desenvolvimento pelo desenvolvimento apenas é muito vago e vazio. Parece que estamos a defender os números pelos números. O que verdadeiramente interessa no desenvolvimento é o seu lado humano. Deveríamos ter um objectivo, um objectivo humano. Queremos desenvolver o quê e para quem? O conceito que faz mais sentido é um desenvolvimento da condição humana por todo o planeta. Um desenvolvimento que melhore essa condição em todas as suas vertentes, interior e exterior. Não só um melhoramento das condições e bem estar físico, mas também um melhoramento das condições e bem estar emocionais. Precisando de nos focar nas condições de vida, na alimentação, na saúde, na ambiente, na educação e na possibilidade de cada ser se desenvolver e atingir a sua plenitude.
Aqui entram questões políticas, filosóficas, ideológicas. E é muitas vezes muito difícil deixar de lado as questões políticas, não no conceito dos governos actuais, mas num conceito de como governar o mundo para o bem de todos.
Mas todo este desenvolvimento deve ser abordado de forma sustentável. E aqui chegamos a outro dos termos que é preciso definir: “Sustentabilidade”.
A Wikipedia define “Sustentabilidade” como “uma característica ou condição de um processo ou de um sistema que permite a sua permanência, em certo nível, por um determinado prazo.” Para manter esse nível é preciso preservar, não destruir. Saber transformar sem desperdiçar.
Vivemos num mundo limitado, global, com recursos limitados e uma população a aumentar (chegámos aos 8 biliões!) onde não é possível crescer indefinidamente. Crescer de um lado implica provavelmente decrescer de outro lado. Por isso temos de ter todo o cuidado em ser sustentáveis, para não esgotar os recursos do planeta nem destruir a fragilidade do mundo em que vivemos.
E é aqui que a Ciência nos pode ajudar na sustentabilidade, de duas maneiras diferentes: pela tecnologia e pelo conhecimento.
Do lado prático e técnico, a Ciência tem um papel fundamental na produção de tecnologia adequada, eficiente e adaptada a um desenvolvimento sustentável. A Ciência pode ajudar muito com toda a tecnologia das energias, da construção, da saúde, da alimentação, procurando soluções inovadoras e as maneiras mais eficientes de produzir, para além de procura de novos materiais, de processos renováveis que impliquem poucos gastos e do aproveitamento optimizado dos recursos naturais implicando a sua preservação.
Mas não nos devemos esquecer que a Ciência também um lado filosófico e de questionamento que nos pode e deve ajudar no nosso lado humano e de atitude a tomar com respeito à sustentabilidade, usando o conhecimento adquirido, questionando os princípios científicos e interiorizando toda a necessidade de equilíbrio entre o ser humano e a natureza. Se houver um melhor e mais profundo conhecimento do mundo natural que nos rodeias poderemos mais facilmente aceitar e procurar soluções que se adaptem e enquadrem nessa sustentabilidade global.