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Artigo SPROWT | Patrizia Luchetta

A Arte da Mudança: Construindo Ecossistemas de Impacto através da Criatividade e das Parcerias
Não é por acaso que o Objectivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 17 se foca nas parcerias. Pelo contrário, é um reconhecimento claro de que o desenvolvimento sustentável não pode ser alcançado de forma isolada. A colaboração entre países, sectores e diferentes intervenientes é essencial para mobilizar recursos, partilhar conhecimentos e construir capacidades colectivas. De várias formas, o ODS 17 é o “cimento” que liga os outros 16 Objectivos. Tal como o progresso numa área da Agenda 2030 reforça os avanços noutras, nenhum actor isolado — sejam governos, empresas ou sociedade civil — consegue enfrentar sozinho os desafios globais.
Na Charlotte in red, o papel dos artistas e criativos neste contexto é particularmente significativo. Foi precisamente esta convicção que deu origem à nossa iniciativa “The Art of Change – Creatives (on the) Move” (A Arte da Mudança – Criativos em Movimento).
Parcerias no Coração do Desenvolvimento Sustentável
O reconhecimento do papel da criatividade não é novo. Em 2021, as Nações Unidas declararam o Ano Internacional da Economia Criativa para o Desenvolvimento Sustentável, destacando que a criatividade não é apenas cultural, mas também económica e ligada ao desenvolvimento. Posicionada como um sector estratégico para os ODS — especialmente após a COVID-19 — a economia criativa foi apresentada como um motor de crescimento económico, igualdade de género e inclusão social.
Contudo, embora valiosa, esta abordagem focava-se principalmente nas dimensões económicas e laborais da criatividade. Na Charlotte in red, quisemos ir mais além: posicionar os artistas e criativos como parceiros plenos nos ecossistemas de mudança, essenciais para enfrentar os desafios da sustentabilidade de forma holística.
Por Que a Criatividade Importa para a Agenda 2030
Mas o que significa, na prática, construir um ecossistema de impacto, e de que forma a criatividade pode ter um papel activo?
Um ecossistema pode ser entendido como uma rede de actores diversos — pessoas, organizações, instituições, tecnologias e políticas — a trabalhar de forma interligada e complementar. Já o impacto refere-se a mudanças positivas e mensuráveis, idealmente alinhadas com os ODS.
Portanto, construir ecossistemas de impacto é criar condições onde diferentes intervenientes possam co-criar, experimentar e escalar soluções que nenhum actor conseguiria alcançar sozinho.
Elementos centrais desses ecossistemas incluem:
- Colaboração entre múltiplos actores: ONGs, empresas, governos, artistas, universidades e comunidades — cada um traz recursos, criatividade, conhecimento e legitimidade únicos.
- Propósito partilhado e alinhamento: Uma visão comum (neutralidade carbónica, economia circular ou os próprios ODS) cria sinergias e evita esforços isolados.
- Infra-estruturas e plataformas: Espaços físicos, incubadoras ou redes digitais facilitam a colaboração e garantem medição, transparência e responsabilização.
- Financiamento e recursos: Modelos de financiamento misto — público, privado, filantrópico — são cruciais para a escalabilidade e sustentabilidade a longo prazo.
- Escalabilidade e replicação: Os projectos-piloto devem ser apoiados, mas também integrados nos sistemas existentes, para que soluções eficazes possam ser replicadas a nível regional ou global.
- Cultura e criatividade: Talvez o elemento mais subestimado, este “cimento” ajuda a construir identidades, mudar narrativas e inspirar o sentido colectivo de responsabilidade pela mudança.
Artistas como Catalisadores de Mudança: Lições do Passado
A história oferece exemplos poderosos de como a produção cultural pode alterar o rumo de grandes desafios globais. Por exemplo, o colectivo artístico Gran Fury, activo no final dos anos 1980, teve um papel fundamental no discurso público sobre o VIH/SIDA. Como braço artístico do movimento ACT UP, as suas campanhas visuais marcantes — como o icónico cartaz “Kissing Doesn’t Kill” (Beijar Não Mata) — combateram o estigma e forçaram os decisores políticos a confrontar a crise. Ao fundir arte com activismo, esbateram fronteiras entre expressão cultural e advocacia pela saúde pública, contribuindo para reformas políticas, aprovação mais rápida de medicamentos e mais financiamento para a investigação.
Mais recentemente, iniciativas como as da ART 2030, uma ONG dinamarquesa, continuam a mostrar o poder da criatividade na Agenda 2030. O seu projecto “Future Ours” (2024) apresentou obras de artistas como Otobong Nkanga e Maya Lin em Nova Iorque e na sede da ONU, promovendo reflexão durante a Cimeira do Futuro. Outro exemplo, o projecto “Interspecies Assembly” (2021), viu o colectivo SUPERFLEX projectar arte sobre o clima e os oceanos no edifício da ONU, fundindo narrativa ecológica com intervenção cultural.
Estes exemplos mostram como intervenções artísticas podem mudar percepções, inspirar empatia e criar impulso político — componentes essenciais da mudança social.
“É importante agir e perceber que podemos fazer a diferença. Isso encoraja outros a também agirem, e então percebemos que não estamos sós, e que as nossas acções acumuladas realmente fazem uma diferença ainda maior. É assim que espalhamos a Luz. E isso, claro, dá-nos ainda mais esperança.”
— Jane Goodall
Quando a Arte Encontra o Mundo Empresarial: Parcerias Inspiradoras
Igualmente inspiradores são os exemplos em que criativos colaboram directamente com empresas, instituições financeiras ou galerias, promovendo mudança sistémica.
Por exemplo, na digressão Music of the Spheres da banda Coldplay, a parceria com a BMW resultou na criação da primeira bateria móvel recarregável para concertos. Com inovações em tecnologia LED e logística, a parceria reduziu as emissões de CO₂ em 50%, estabelecendo um novo padrão para concertos sustentáveis.
De forma semelhante, a galeria Hauser & Wirth alinhou as suas operações com os objectivos da Agenda 2030 e colaborou com a artista Jenny Holzer em edições limitadas, cujas receitas foram destinadas a ONGs focadas no clima. Isto mostra como galerias comerciais — muitas vezes vistas apenas como intermediárias culturais — podem influenciar padrões de sustentabilidade no seu sector.
Estes casos reforçam por que razão artistas, empresas e financiadores devem trabalhar lado a lado. Juntos, podem:
- Ultrapassar os limites da inovação, mantendo a viabilidade e escalabilidade.
- Construir confiança pública ao ligar integridade cultural com compromissos empresariais.
- Integrar as dimensões técnicas, culturais e políticas da sustentabilidade.
A Arte da Mudança – Um Projecto em Movimento
É esta convicção — de que os artistas e criativos são parceiros essenciais para a mudança sistémica — que impulsiona o nosso projecto principal, “The Art of Change – Creatives (on the) Move”.
O projecto documenta artistas mulheres em várias cidades do mundo que contribuem para o alcance de um ou mais ODS. Cada edição destaca três artistas locais através de um documentário curto, seguido de uma mesa-redonda pública onde artistas e líderes empresariais exploram oportunidades de colaboração.
Nota: O trabalho da Charlotte in red foca-se em artistas mulheres como parte do seu compromisso institucional.
Os Nossos Três Objectivos Principais:
- Divulgar o trabalho das artistas a um público mais amplo, através de documentários de acesso gratuito, inspirando outros pelo exemplo.
- Lançar um debate mais amplo sobre a importância de integrar o sector criativo nos ecossistemas de impacto.
- Impulsionar colaborações entre artistas, líderes corporativos e outros actores, criando uma rede internacional em crescimento, comprometida com a co-criação.
No centro desta missão está o poder do diálogo. Muitas vezes, os sectores compreendem os desafios apenas a partir da sua própria perspectiva. Ao criar espaços para conversas honestas, o The Art of Change promove um activismo positivo — ou “artivismo” — que visa ligar diferentes visões e promover acções conjuntas para um futuro sustentável.